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Resenhas sobre "Alegria Pura"


Stela Maris Rezende é, sem dúvida, a grande revelação de autor para o público jovem dos anos oitenta. Ela conquistou um lugar especial na literatura brasileira ao vencer o Concurso João-de-Barro de 1986 com O último dia de brincar e agora confirma o seu talento ao receber o Prêmio Nestlé pelo excelente texto Alegria Pura. Neste bordado de pequenas intrigas, grandes expectativas e doces vinganças, Stela Maris revela todos os encantos do seu estilo, ao mesmo tempo lúcido e cerebral. A linguagem é muito trabalhada e resgata, limpidamente, o dizer regional, pleno de graça em sua simplicidade e precisão. Em todos os detalhes está presente o Brasil interiorano, antigo, parado no tempo, contemporâneo do país urbano e frenético, mas ainda não contaminado por ele. As cinco moças que Maurícia visita têm nome delicioso, mas raro para os leitores citadinos: Liló, Mazé, Isorina, Dileusa, Célida. A descrição das casas e dos ambientes faz-nos voltar a um tempo, aquele de nossos avós. São pés de antúrio e cheiro de pamonha, vasinhos de avenca e compotas caseiras, pés de couve ao lado de tanques de lavar roupa, tufos de cravos e doces de laranja azeda. As metáforas com que Stela Maris descreve as mudanças de comportamento nascem dessa profunda ligação com a terra: “de azeda pra melado”, “o que era suçuarana agora é coelhinha”, “pano de chão pode virar metro e meio de seda?”. A própria trama remete aos vilarejos de onde os rapazes saem logo que a cidade lhes permite para tentar a vida na cidade grande. Cinco moças disputam o mesmo namorado, “difícil um pretendente assim de futuro”, e é com esse trunfo que conta sua irmã Maurícia para uma vingança engraçada e ingênua que aos poucos transforma “a alegria malsã em alegria pura”. Um texto curto, simples e engraçado que encerra uma visão profunda do ser humano. O mundo interior das meninas-moças aprisionadas em suas vidas sem futuro. Com esses dados e a marca de uma natureza onipresente, Stela Maris Rezende compõe um vigoroso painel tecido por delicados fios.

Laura Sandroni é ensaísta e crítica de Literatura

In: REZENDE, Stela Maris. Alegria Pura. São Paulo, Scipione, 1988

Alegria Pura ganhou o primeiro lugar da Bienal Nestlé de 1988, categoria infanto-juvenil, e teve como comissão julgadora grandes nomes da Literatura e da Crítica no Brasil: Ruth Rocha, Nelly Novaes Coelho, Laura Sandroni, Vivina de Assis Viana e Maria Clara Machado

 
Alegria Pura, leve e simples. Mas profundo. Tatiana Belinky
Mesclando humor e emoção, o livro atrai crianças e adultos. Meses atrás, comentei aqui um livro muito bonito, ganhador do Prêmio João-de-Barro (de Belo Horizonte), de Literatura Infanto-Juvenil de 1986, mas que só no começo deste ano chegou às minhas mãos: O último dia de brincar, de Stela Maris Rezende. “Prestem atenção a este nome!”, escrevi naquela ocasião, entusiasmada, sentindo o grande talento da jovem professora mineira. E não deu outra: Stela Maris Rezende levantou, entre muitos e bons concorrentes, o prestigioso e importante prêmio da categoria infanto-juvenil da Quarta Bienal Nestlé de Literatura Brasileira, promovida de 4 a 8 deste mês. (...) Alegria Pura é o título do livro premiado de Stela Maris Rezende (publicado pela Scipione, grande especialista no gênero, que editou todos os livros premiados desta Bienal Nestlé). É um livro de pouco mais de 30 páginas, com algumas singelas ilustrações em preto-e-branco, de Laíse A. Rodrigues, tipos graúdos, margens largas, grandes espaços entre os “capítulos”- se é que este nome se aplica aos breves parágrafos e rápidos diálogos, que chegam a ser quatro por página. Portanto, um texto curto, que uma criança (ou um adolescente, ou um jovenzinho, ou um adulto) lê facilmente em menos de uma hora. Só que não fica nisso, porque, chegando à última página, volta-se logo para a primeira, a fim de saborear com vagar e deleite tanto a graciosa história quanto a deliciosa linguagem – lindamente elaborada na sua aparente simplicidade – sem esquecer o “pano de fundo” de uma vida interiorana, “antiga”, apesar de encravada nesta época agitada e cosmopolita, que não chegou a atingir as casadoiras mocinhas Liló, Mazé, Isorina, Dileusa e Célida. A primeira linha do livro é – “Alegria malsã?” – e a última é outra pergunta: “Alegria malsã pode virar alegria pura?” Stela Maris Rezende consegue, em uma admirável síntese, transmitir ao leitor a impressão de todo um mundo – tão próximo e tão distante de nós, das grandes cidades – um mundo “parado no tempo, aquele dos nossos avós. São pés de antúrio e cheiro de pamonha, vasinhos de avenca e compotas caseiras, pés de couve ao lado de tanques de lavar roupa, tufos de cravos e doces de laranja azeda”, - como diz, entre outras coisas bonitas, Laura Sandroni, que sabe das coisas. Stela Maris Rezende é uma escritora importante, das melhores que temos, nesta difícil área infanto-juvenil. Domina com igual desenvoltura e mestria a temática e o estilo: o que diz e como o diz. E sabe mesclar em boa medida, emoção, humor, observação – ao lado de leveza, simplicidade e profundidade. Alegria Pura é um livro que é... beleza pura.

Tatiana Belinky é escritora e crítica de Literatura

Jornal da Tarde, São Paulo, segunda-feira, 08 de agosto de 1988

 
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