top of page

Resenhas sobre "O Sonho Selvagem"


Quando o amor é um sonho selvagem
O Sonho Selvagem, de Stela Maris Rezende, ilustrações de Rogério Borges, editora Moderna, coleção Veredas, tem um tom intimista, ambígüo, feminino. A autora dá à personagem-narradora o nome Ângela. E a história transcorre no campo, entre árvores, passarinhos soltos, muito vento, uma montanha. Ângela se revela uma moça calada, quase sozinha, às voltas com seus sentimentos. Com certeza não sabe o significado do seu nome e vê que nunca pode usar as asas que dona Marinês fabrica para as coroações de maio. Por causa do que sente, do que não fala, porque se maltrata. E vive seu amor no limite do ódio. Ângela e Luís, feminino e masculino, sozinhos, despossuídos, maltratados pela vida, também se maltratam, quando querem o amor, mas desconhecem sua linguagem. Que, apesar de tudo é amor, um sonho selvagem, quando se está perto da terra, à mercê das ervas e do vento. Daí esse conflito barroco, entre anjo e demônio, que Stela Maris Rezende traduziu tão bem. Fez um texto bonito, usando palavras, termos da terra, sem carregar no regionalismo. Criou personagens intensamente identificados a essa terra, Minas Gerais rural, com seus restos de arcaísmos e mistério. Num livro que o adolescente da cidade saberá entender e gostar. Pois o texto, literário mas sem hermetismo, mostra ao leitor um outro mundo, tão próximo e quase desconhecido, cheio de força e beirando precipícios. É que os personagens em sua adolescência têm basicamente as mesmas preocupações que os leitores que a autora procura entender: seus sentimentos, seu corpo e sua alma, sua carência do outro. Os desenhos de Rogério Borges, em preto apenas, acentuando os volumes e as sombras, em detrimento da linha e do contorno, são dramáticos e escorregadios, denunciando segredos. O ilustrador explorou a dicotomia anjo-demônio e por aí construiu sua linguagem, numa leitura plástica que mantém a atmosfera do texto.

Lino de Albergaria é escritor premiado e crítico de Literatura

Jornal Hoje Em Dia, Belo Horizonte, domingo, 25 de junho de 1989

 
bottom of page